Política de Habitação com Participação em Terras da União: o que se aprendeu com a luta e o que mudou no território?

Urânia Flores da Cruz Freitas

Resumo


Autores: Urânia Flores

                Magda Lúcio

               Fernando Bessa

                Doriana Daroit

 

Sessão temática: ST7

 

            No ano em que o Estatuto das Cidades completa 14 anos, a sociedade brasileira tem muito o que avaliar e, principalmente, realizar para cumprir o previsto nesse importante documento, e nas práticas concretas de efetivação da política urbana. Neste texto, nosso olhar estará centrado na gestão e no uso das terras públicas da União para habitação de interesse social, e em como isso influenciou a mudança no território e no processo educativo dos atores, no Brasil.

            A questão urbana no Brasil começou a ser discutida, de forma participativa, com o advento da eleição de um partido de esquerda. Após este marco os movimentos sociais de moradia começaram a ganhar espaços de falas e ações concretas nas instituições governamentais, em nível federal.  Os representantes do Fórum Nacional da Reforma Urbana – FNRU conseguiram emplacar mudanças jurídicas e institucionais marcadamente de caráter inverso as políticas praticadas até então, embora a luta no âmbito deste movimento tenha garantido suas vitórias desde a assembleia constituinte que culminou na inclusão do capítulo sobre a política urbana na Constituição.

            Assim, visamos refletir sobre as ações do governo federal no tocante a política urbana, com enfoque centrado em compreender as concepções de território, habitação de interesse social, cidade e participação dos atores envolvidos nas ações da Secretaria do Patrimônio da União – (SPU); a visão desses atores em relação às ações de regularização fundiária e de destinação de imóveis públicos para habitação de interesse social - HIS; as estratégias para viabilizar o controle social por parte da sociedade civil e como tais ações possibilitaram ou não a reconfiguração do território; e o que se aprendeu com tais experiências.

            A SPU, ao pensar as ações e propor medidas para contribuir com as políticas habitacionais voltadas para população de baixa renda criou espaços de reflexão e ação que atuam de forma concreta nos territórios em nível nacional, desde 2009. Esses espaços têm como um de seus princípios a regularização fundiária e a destinação de imóveis para HIS, com gestão participativa. 

            A SPU por meio de grupos de trabalho estabeleceu critérios e objetivos claros de repasse de seus imóveis para o cumprimento de sua função social, disponibilizou por meio de Termo de Anuência aos movimentos sociais de moradia, imóveis situados em quase todos os Estados para que pudessem ser construídas moradias em terras públicas. A parceria é com o Ministério das Cidades, prefeituras locais, Caixa Econômica e Conselhos Estaduais das Cidades. A pluralidade dos atores revela que é necessário cada vez mais, esforço conjunto para que possamos construir cidades de direito e reconhecer o direto as cidades, como também compreender o que ocorre no (s) território (s).

 

            Para HAESBAERT (2005):

 

desde a origem o território nasce com uma dupla conotação, material e simbólica, pois etimologicamente aparece tão próximo de terra-territorium quanto de terreo-territor (terror, aterrorizar), ou seja, tem a ver com dominação (jurídico-política) da terra e com a inspiração do terror, do medo – especialmente para aqueles que, com esta dominação, ficam alijados da terra, ou no “territorium” são impedidos de entrar. Ao mesmo tempo, por extensão, podemos dizer que, para aqueles que têm o privilégio de usufruí-lo, o território inspira a identificação (positiva) e a efetiva “apropriação”.

 

            Segundo o autor, em qualquer acepção o território tem a ver com o poder, mas não apenas com o poder político de dominação, tem a ver também, com o poder simbólico de apropriação. Estes termos foram cunhados por LEFEBVRE, que distingue dominação de apropriação, o primeiro como possessão e o segundo como propriedade, vendo a possessão como característica do vivido e como valor de uso (simbólico) e propriedade como algo mais concreto e funcional, visto como valor de troca (material).

            Salientamos a visão de LEFEBVRE (2001, p.52) quando afirma que a cidade deve ser associada mais como obra de arte do que como simples produto material, pois se há produção das cidades e das relações sociais nas cidades, é ao mesmo tempo produção e reprodução de seres humanos por seres humanos, então é mais que a produção de objetos. Dessa forma, ao estudar o território como conceito temos que levar em conta estes sentidos explicitados, pois vamos analisar a partir das ações do Estado.

            A cidade é aqui reconhecida como lócus das práticas democráticas para efetivação da esfera pública da política em todas as suas faces, neste particular, a urbana.  A decisão da União em disponibilizar seus imóveis para contribuir com este processo vem ao encontro do instituído na Constituição Federal e no Estatuto das Cidades em que toda propriedade deve cumprir sua função social com equilíbrio e respeito ao meio ambiente.

            Neste texto, discutiremos a participação por meio da análise das instâncias criadas pela SPU, buscando conhecer as possíveis mudanças ocorridas nos territórios e o fortalecimento da denominada sociedade civil de GRAMSCI (1968). Ao analisar a crise do Estado liberal e o fortalecimento do capitalismo como sistema hegemônico, o autor vislumbrou que tal período revelou novos tipos de relações sociais que permitiram a socialização da política; assim, desenvolveu sua teoria do Estado ampliado em que os problemas relativos ao poder ficaram mais complexos e isso fez emergir a sociedade civil, ou melhor, a esfera pública política, antes restrita a burguesia, cedeu lugar à esfera pública ampliada protagonizada politicamente por crescentes organizações de massa.

            Para verificar a ação dos atores usaremos o arcabouço metodológico da teoria do ator-rede de Latour, (2012), Para analisar a luta dos movimentos por moradia no Brasil, segundo essa teoria temos que renunciar ao quadro de referências fixas para deixarmos os atores livres para  atuar e decidir sobre suas ações, das quais a sociedade é constituída.

            Segundo o autor (2013), existe um fio de Ariadne que é a rede de práticas e de instrumentos, de documentos e traduções, e é esta rede que nos ajudará no percurso pretendido.


Apresentação
Última alteração
16/09/2015